CRISTIANISMO E UNIVERSIDADE

Seja bem-vindo a "CRISTIANISMO E UNIVERSIDADE". Aqui procuraremos apresentar artigos acerca de assuntos acadêmicos relacionados aos mais diversos saberes, mantendo sempre a premissa de que a teologia é a rainha das ciências, pois trata dos fundamentos (pressupostos) de todo pensamento, bem como de seu encerramento ou coroamento final. Inspiramo-nos em John Wesley, leitor voraz de poesia e filosofia clássica, conhecedor e professor de várias línguas, escritor de livros de medicina, teólogo, filantropo, professor de Oxford e pregador fervoroso do avivamento espiritual que incendiou a Inglaterra no século XVIII.

A situação atual é avaliada dentro de seus vários aspectos modais (econômico, jurídico, político, linguístico, etc.), mas com a certeza de que esses momentos da realidade precisam encontrar um fator último e absoluto que lhes dê coerência. Esse fator último define a cosmovisão adotada. Caso não reconheçamos Deus nela, incorreremos no erro de absolutizar algum aspecto modal, que é relativo por definição.

A nossa cosmovisão não é baseada na dicotomia "forma e matéria" (pensamento greco-clássico), nem na dicotomia "natureza-graça" (catolicismo), nem na "natureza-liberdade" (humanismo), mas, sim, na tricotomia "criação-queda-redenção" (pensamento evangélico).

ESTE BLOG INICIOU EM 09 DE JANEIRO DE 2012





terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

POR QUE O CRISTIANISMO TRIUNFOU NO MUNDO ANTIGO?


Rev. Glauco Filho

No final do século IV, o imperador romano Juliano tentou restaurar o culto pagão como culto de Estado a fim de frear o crescimento do cristianismo. Em uma carta dirigida ao Sumo Sacerdote da Galácia, Juliano falou do motivo que, na sua interpretação, fora a causa de êxito dos cristãos, a quem ele chamava de os “ímpios galileus”. De acordo com Juliano, os ‘ímpios galileus’ “proporcionam alimentos não só aos seus, mas também aos nossos”. Para o Imperador, “o altruísmo feito aos estranhos, a solicitude para dar sepultura aos mortos e a suposta pureza de conduta” dos cristãos” tinham justificado o triunfo de sua mensagem no mundo antigo.
            Segundo João Crisóstomo, a comunidade antioquiana, durante o século IV, havia socorrido três mil viúvas e mulheres solteiras, sem falar no que fizera por um grande número de encarcerados, enfermos, incapacitados e mendigos.
            Na Idade Moderna, Gerhard Uhlhorn descreveu a antiguidade pagã como um mundo sem misericórdia, o que vem a ressaltar ainda mais a importância da diaconia social do cristianismo.
            O Imperador Juliano tentou reverter o crescimento do cristianismo e promover o paganismo por uma estratégia de imitação pagã da diaconia social cristã. Ele recomendou aos sacerdotes pagãos que fizessem a mesma obra social dos cristãos. Obviamente, o seu método não obteve êxito.
            Hoje, nós vemos o Estado fazendo muito da obra social (serviços hospitalares, escola pública, merenda escolar, etc.) que outrora foi feita pelas igrejas cristãs. No entanto, as pessoas costumam reclamar da desumanidade e indiferença de médicos e funcionários públicos. O Estado pode criar instituições, mas não pode instilar o amor nas pessoas.
            O filósofo neoplatônico Alexandro de Licópolis do Alto Egito atribuiu a vitória cristã no mundo antigo à prática da exortação ética. Os filósofos gregos consideravam o homem bom, mas ignorante. Eles, então, procuravam desenvolver pensamentos teóricos sobre o bem e a virtude para esclarecer os seus concidadãos. Não tiveram êxito. Os cristãos partiam do pressuposto de que o homem era mau (por causa da queda adâmica) e de que cada um sabia o que era certo e errado em sua consciência. Em suma, o homem era transgressor e não ignorante. Assim, os cristãos exortavam os homens ao imediato arrependimento, assegurando-lhes o perdão pela fé na obra expiatória de Cristo na cruz.
            Porfírio, um discípulo de Plotino (não cristão), observou que a possibilidade de perdão para uma vida passada com desmandos, bem como a promessa de uma nova vida pelo poder do evangelho, atraiu para o cristianismo os que vinham da prostituição, do adultério, da embriaguez, do latrocínio, do homossexualismo, etc. A mensagem cristã atraiu os delinqüentes marginalizados pela sociedade.
            Os filósofos que desdenhavam do cristianismo do ponto de vista teórico ficavam admirados com a certeza de salvação exibida pelos cristãos na hora do martírio. Foi essa admiração que levou o filósofo Justino à conversão.
            Orígenes, mestre da igreja antiga, disse que a mensagem do evangelho tinha em si mesma um poder de convencimento, comoção e transformação através da obra do Espírito Santo. Por esse motivo, o cristianismo cresceu tão poderosamente. Essa afirmação também seria feita por Lutero para explicar a fenomenal propagação da Reforma do século XVI.
            Lucien Jerphagnon disse que a religião pagã de Roma era apenas doméstica e política, o que deixava um vazio nas outras áreas da vida. A filosofia procurava ocupar esse espaço. A religião cristã, porém, alcançava o homem por inteiro e em todas as áreas de sua vida. A religião pagã era ritualística e formal, mas o evangelho apresentava “um Deus sensível ao coração” (Pascal), “a transcendência personificada” (Luc Ferry). Isso era muito diferente do frio “primeiro motor” de Aristóteles.
             O Deus cristão se encarnara e entrara na história humana, participando de  seus sofrimentos e aflições. Tudo isso fora feito com o fim de fazer provisão para a salvação de todos e de cada um. Nada poderia se comparar a essa valorização da pessoa humana e a essa manifestação inédita de amor.
No cristianismo, o sacrifício pagão de animais foi substituído pelo “sacrifício” de si mesmo, uma entrega incondicional do homem ao senhorio de Cristo.
Precisamos de um avivamento da fé cristã! Eu não me refiro a esse pseudocristianismo formal, supersticioso, mundano e rotinizado. Eu me refiro ao cristianismo legítimo, o qual pode restaurar a sociedade.

Dr. Glauco Barreira Magalhães Filho
Doutor em Sociologia (UFC)
Pós-Graduado em Teologia Histórica e Dogmática (FAERPI)

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Livro "HERMENÊUTICA JURÍDICA CLÁSSICA" (3a. ed.) do Prof. Glauco Barreira Magalhães Filho



"A presente obra trata da hermenêutica jurídica em uma perspectiva metodológica. A ciência jurídica é classificada como ciência cultural ou do espírito. O método jurídico é definido por suas características e por sua adequação ao objeto. As técnicas e procedimentos interpretativos são apresentados e o seu uso é exemplificado. Os sistemas interpretativos são esclarecidos e comparados. O estudo hermenêutica é desenvolvido sob os paradigmas histórico, procedimental e epistemológico. A aplicação do Direito é pensada à luz da tridimensionalidade jurídica. Também são tratadas questões relativas à idéia de sistema, como a solução de antinomias e a colmatação de lacunas do ordenamento. O objetivo da obra é estabelecer regras de validação imprescindíveis à discussão científica do melhor sentido para as normas e para as condutas" (4a Capa do livro).

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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A CRENÇA EM DEUS E O FUNDACIONALISMO

Rev. Glauco B. Magalhães Filho no Tabernáculo Metropolitano (Londres), a igreja onde Charles H. Spurgeon, pastor batista do século XIX, pregava os seus sermões


O “fundacionalismo clássico” afirma que uma crença deve se justificar em outras crenças até que se possa chegar em proposições apropriadamente básicas (auto-evidentes ou incorrigíveis). A chamada “Teologia Natural” procura encontrar justificativa para a crença em Deus através desse caminho.
            De acordo com o filósofo protestante Alvin Plantinga, a perspectiva reformada assumiu um caminho diferente da “Teologia Natural” para falar da existência de Deus, afastando-se do fundacionalismo clássico.
Os reformados defendem a racionalidade da crença em Deus sem apelar para outras crenças ou proposições anteriores. Assim, a crença em Deus seria apropriadamente básica.
            O confronto filosófico de Alvin Plantinga, acima de tudo, é com o “indiciarista” que considera a crença em Deus como sendo irracional ou noeticamente inferior por não se basear em indícios suficientes. A idéia de racionalidade da crença evoca a presença de um cânone (norma) a ser satisfeito para justificar a crença. Assim, a crença do intelecto se basearia em uma ética segundo a qual o assentimento deve corresponder aos indícios. Tal posição ignora que a crença em Deus é espontânea e intuitiva e que muitas crenças não estão sob o nosso controle, ou seja, não podemos nos livrar delas simplesmente tentado fazê-lo.
            Alvin Plantinga afirma que há certas crenças que não poderiam ser infundadas, pois a experiência juntamente com certas circunstâncias dá a justificação suficiente para adota-las. Tais crenças se expressam em muitas afirmações cotidianas. Eu digo, por exemplo, que alguém está com dores ou zangado porque a pessoa exibe o comportamento típico de quem tem dores ou está zangada. Nesses casos, há uma circunstância que serve como fundamento de justificação. Acerca da questão das circunstâncias, disse Plantinga:

            “Se algo me aparece da maneira habitual, mas sei que estou a usar óculos cor-de-rosa, ou que sofro de uma doença que causa o aparecer-me assim, independentemente da cor dos objetos próximos, então não tenho justificação... De igual modo para a memória. Suponha-se que sei que a minha memória não é fiável... Sob estas condições, não tenho justificação para aceitar como básica a crença de que tomei o café da manhã, embora pareça recordar-me que tomei”.[1]

            Uma crença só é apropriadamente básica em determinadas condições. Essas condições são o fundamento da justificação. A crença em Deus é básica, mas não é injustificada, pois se justifica por certas condições. Há em nós uma disposição (divinitatis sensum) para atribuir a existência do universo à criação divina e a beleza da natureza ao artífice supremo. O sentimento moral absoluto evoca uma lealdade que atribuímos intuitivamente ao soberano legislador. Depois de errar, ainda que não tenhamos testemunhas visíveis, sentimos uma culpa que nos dá a percepção de responsabilidade perante um juiz onipresente. Ao nos arrependermos, sentimos que fomos perdoados através da crença em um Deus que perdoa. Uma pessoa em perigo se vê logo pedindo socorro a Deus, enquanto a alegria pelo sabor da vida nos conduz a expressões de gratidão que não são dirigidas aos homens.
            Há, portanto, várias circunstâncias que chamam a crença em Deus (culpa, perigo, gratidão, deslumbramento ante a criação, etc.) Elas geram proposições (Deus cria, desaprova, perdoa, atc.) apropriadamente básicas nas circunstâncias dadas. De certo modo, não é a crença em Deus que é apropriadamente básica, mas as proposições que discriminam os seus atributos e ações. Tudo isso, porém, é muito consistente com a proposição de que há um Deus e de que fomos criados para viver uma vida de relação com ele.

             Dr. Glauco Barreira Magalhães Filho
            Doutor em Sociologia da Religião (UFC)
            Doutor em Teologia (Th. D.) - Ethnic Christian Open University
            Doutor em Ministério (D. Min.) – Faculdade de Teologia Metodista Livre
            Diretor do Instituto Pietista de Cultura (IPC)


[1] Is Belief in God Properly Basic? (Noûs, Vol. 15, No. 1, 1981, pp. 41-51)

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

A DEMOCRACIA E A GLOBALIZAÇÃO

            Prof. Glauco Filho visitanto o túmulo de John Bunyan (autor de "O Peregrino") em Londres

Os elementos negativos da democracia clássica eram a exclusão dos escravos e das mulheres e a falta de reconhecimento do valor do indivíduo enquanto pessoa (que é uma característica do Estado de Direito).  Alguns desses pontos deficitários se explicam pelo contexto histórico. Os escravos eram normalmente aqueles que haviam sido vencidos em batalha. Eles eram reduzidos à condição de servidão para não serem mortos. 
            Quanto à prioridade dada ao coletivo em detrimento do individual, isso se devia ao fato de aquelas cidades gregas estarem em guerra quase permanente. Até mesmo nos dias atuais, em situações extremas, a segurança geral fica acima do bem individual. Constatamos isso nas restrições a direitos individuais durante períodos de crise institucional (estado de defesa, estado de sítio, estado de guerra, estado de calamidade pública, etc).
Leo Strauss diz que uma sociedade humana nunca pode alcançar a perfeição da justiça em razão do tratamento e dos sentimentos diferenciados para com o cidadão e o estrangeiro. É essa separação que mantém a existência da guerra:

“Assim, a sociedade civil tem de cultivar hábitos belicosos. Mas esses hábitos são contrários às exigências da justiça. Se as pessoas fazem a guerra, então procuram a vitória, e não estão preocupadas em atribuir ao inimigo aquilo que um juiz imparcial e criterioso consideraria benéfico para ele... Implica que a justiça possível na cidade não pode ser mais do que imperfeita ou não pode ser inequivocamente boa”.[1]

           Somente no milênio, sob o governo universal de Jesus Cristo, quando não haverá guerras, poderá acontecer a paz:

“Ele julgará as nações e será juiz entre muitos povos; e estes converterão as suas espadas em lâminas de arado, e as suas lanças, em foices; uma nação não levantará espada contra outra nação, nem aprenderão mais a guerra” (Isaías 2: 4).

Toda tentativa preliminar de abolir a soberania das nações através do motivo econômico da globalização só levará a uma iniqüidade maior, culminando com o aparecimento do Anticristo como regente mundial.
Embora combatamos a injustiça de forma permanente, lembramos que sempre remanescerá injustiça nas instituições, o que só deve nos levar a aspirar a vinda de Cristo. Não somos capazes de perfeição, mas somente o Senhor.
Falamos da democracia clássica e de suas deficiências, mas admitimos que ela também tinha muitos princípios superiores aos da democracia moderna. Os gregos, por exemplo, entendiam que os homens não eram iguais em sabedoria. Nem todos estavam na mesma altura do caminho para a sabedoria. Assim, os gregos falavam do governo da sabedoria com o consentimento. O consentimento era necessário para que a sabedoria encontrasse realização, daí a preocupação com a persuasão racional, mas o consentimento não fazia a sabedoria. Na democracia moderna, não apenas se presume a igualdade ontológica entre os homens, mas também se presume que todos são igualmente “sábios”. Na visão moderna, a sabedoria não é descoberta e demonstrada, mas criada pelo consentimento.
Na democracia clássica, os princípios morais não eram objeto de deliberação, mas de reconhecimento filosófico. A democracia do período da globalização quer não apenas colocar para a decisão do povo quais serão os governantes, mas também o que será certo ou errado do ponto de vista moral. Além disso, essa democracia é corrompida pela mídia e pela manipulação da propaganda. Muitas celebridades são eleitas, bem como os que têm dinheiro para se fazer celebridade. A sabedoria foi substituída pelo exibicionismo e a reputação pelo estrelismo. Os que ganham dinheiro rápido se tornaram os novos heróis de uma sociedade que trocou a moral pela economia.
Na “democracia mundial”, o elemento global engolfou o elemento democrático, pois os órgãos judiciários do terceiro mundo endossam mudanças de paradigmas morais ainda não reconhecidos pela lei nem pela vontade do povo apenas para promover uma uniformidade com os países da Europa.
A democracia da globalização não é baseada na legitimidade (a priori), mas na legitimação (a posteriori). Através da mídia, o povo é “convencido” do que já está decidido para pensar que houve soberania popular e autonomia coletiva. É essa democracia amoral e manipulada da globalização que querem introduzir no islã.
Nos países onde prosperou a reforma protestante, houve mudanças maravilhosas em pouco tempo. O protestantismo defendeu os direitos humanos com base na lei divina e na origem do homem, bem como reforçou a democracia enquanto regime político. A democracia, entretanto, para o protestantismo, era uma forma de o povo vigiar e fiscalizar o poder, tendo em vista a corrupção do homem caído em Adão. A democracia protestante era uma lembrança de nossa miséria, não de nossa grandeza. Quando, porém, o protestantismo perdeu a sua influência no mundo secular, o humanismo assumiu a definição da democracia, pondo-a como coroa da grandeza humana.
Ao longo da história bíblica, nós vemos o resultado da democracia associada à soberba humana. Na Torre de Babel (primeira globalização), nós vemos os homens unidos democraticamente para construir um nome para si. O resultado foi o castigo. Quando Deus diversificou as línguas, mostrou que a soberania das nações ainda é menos iníqua que um governo mundial humano. Os que se rebelaram contra Moisés no deserto, alegaram que todo o povo era santo e, portanto, não deveria ser governado exclusivamente por Moisés e Arão (os escolhidos de Deus). A ira de Deus se acendeu contra os rebeldes e a terra fendida os engoliu. Quando Pilatos, colocou para o povo votar se soltaria Jesus ou Barrabás, o povo escolheu soltar Barrabás e crucificar a Cristo, pois levou em conta razões pragmáticas e nacionalistas.
             A democracia globalizada elegerá o Anticristo. Essa democracia deseja livrar-se de todas as restrições da lei moral inscrita por Deus no coração humano. Ela reflete a união do mundo contra Deus:

“Por que se enfurecem os gentios e os povos imaginam cousas vãs? Os reis da terra se levantam, e os príncipes conspiram contra o Senhor e contra o seu Ungido, dizendo: Rompamos os seus laços e sacudamos de nós as suas algemas” (Salmo 2: 1-3).

Quando o Anticristo assumir o poder, todos se admirarão de como ele afrontará o Deus bíblico sem ser imediatamente punido:

“Este rei fará segundo a sua vontade, e se levantará, e se engrandecerá sobre todo deus; contra o Deus dos deuses falará coisas incríveis e será próspero, até que cumpra a indignação; porque aquilo que está determinado será feito” (Daniel 11: 36).

No final, Jesus “o matará com o sopro de sua boca e o destruirá com a manifestação da sua vinda” (II Tess. 2: 8). Isso acontecerá “quando, naquele dia, ele vier para ser glorificado nos seus santos e admirado em todos os que houverem crido” (II Tess. 1: 10).
Quem tem ouvidos, ouça!]

Dr. Glauco Barreira Magalhães Filho

Mestre em Direito Público, Doutor em Sociologia (do Direito e da Religião), Livre Docente em Filosofia do Direito, Professor da UFC, Professor da Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará (ESMEC) e da Escola Superior do Ministério Público (ESMP), Coordenador do Curso de Direito da Fametro, Coordenador do Centro de Estudos de Direito Constitucional (CEDIC) da UFC e do Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária (NAJUC) da UFC.


[1] Direito Natural e História. Trad. Miguel Morgado. Lisboa: Edições 70, p.129, 131

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

A CRISE DA LINGUAGEM E A TEOLOGIA

                            Rev. Glauco Filho pregando nas Conferências Anabatistas de 2010


            Depois da globalização, houve um maior diálogo cultural no mundo. As nações, por outro lado, perderam a sua homogeneidade interna e se tornaram cada vez mais heterogêneas ou pluralistas. Nesse contexto, as fórmulas para convivência pacífica entre os diferentes passaram a ser necessárias.  Palavras que tinham um sentido preciso receberam um significado amplo para acomodar acordos, ganhando fluidez e ambigüidade. Uma mesma forma de expressão poderia servir a discursos diferentes ou, mesmo, incompatíveis.
Toda essa situação mencionada gerou uma crise da linguagem. Uma palavra pode agora significar qualquer coisa. Nessa situação, a frase de Nietzsche, o profeta do nazismo, encontrou eco: “Não conheço fatos, só conheço interpretações”. Agora, tudo é interpretável, nada é preciso ou definido. Essa teoria não é uma descoberta do que sempre foi, mas uma teoria para o que se criou agora.
Esse problema da crise da linguagem é mais antigo na religião do que no mundo, pois o movimento ecumênico (que procurava unir grupos religiosos bem diversos, como o catolicismo e o protestantismo) e o liberalismo teológico (que procurava tornar a mensagem religiosa interessante ao mundo moderno) antecederam o fenômeno atual de globalização, com o seu “politeísmo de valores”.
Em razão do ecumenismo e do liberalismo, os termos teológicos foram adquirindo sentidos amplíssimos. Grupos religiosos passaram a acordar sobre doutrinas como a da justificação pela graça, mas entendendo diversamente o que era justificação e o que era graça. Certos termos bíblicos sofreram o esvaziamento do seu sentido original para ganharem “relevância” para o mundo moderno.
Diante de tudo isso, muitos estão dizendo que a Bíblia é suscetível de várias interpretações, que não há sentido objetivo na Escritura. Essa situação é uma negação de vários postulados básicos da Reforma Protestante, como os da suficiência, perspicuidade e auto-interpretação da Bíblia.
Há uma investida satânica para desacreditar a possibilidade de uma legítima interpretação da Palavra de Deus. De fato, se formos levar em conta o sentido que os termos bíblicos passaram a ter em vários discursos, não encontraremos senão critérios pragmáticos para preferir um discurso ao outro. Precisamos voltar a escutar Lutero quando disse que a Bíblia era intérprete de si mesma. Nós temos que entrar no mundo bíblico para compreender o que as palavras significavam dentro dele.
Quando nós começamos a ler a Bíblia, há uma fusão entre o nosso horizonte contemporâneo e o horizonte bíblico. Cabe a nós permitir que o horizonte bíblico triunfe sobre o nosso horizonte atual. Foi por esse caminho que Agostinho de Hipona foi escrevendo suas “Retratações” ao longo de sua vida cristã.
Não nego que sejamos influenciados pelo nosso tempo no ponto de partida de nossa interpretação da Bíblia, mas temos que nos corrigir no caminho. A "Bíblia somente" deve ser o nosso ponto de chegada. Conforme explicou E.D. Hirsch (“Validity in Interpretation”), há uma lógica de validação da interpretação, ou seja, há critérios que permitam saber se a interpretação é válida ou não.
Cabe a nós protestantes e evangélicos legítimos, portanto, continuar pregando a Escritura como única regra de fé e prática, bem como a existência de seu sentido intrínseco passível de ser descoberto pelo livre exame do crente piedoso.

Dr. Glauco Barreira Magalhães Filho
Professor de Hermenêutica da Universidade Federal do Ceará
Professor da Faculdade Teológica Unida de Fortaleza (FTUfor)
Coordenador do Curso de Especialização em Teologia Histórica e Dogmática da FAERPI

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

LITERATURA DO PROFESSOR GLAUCO BARREIRA MAGALHÃES FILHO

LIVROS DO PROFESSOR GLAUCO BARREIRA MAGALHÃES FILHO:

"Hermenêutica e Unidade Axiológica da Constituição" (4a. ed. Del rey)
"Hermenêutica Jurídica Clássica" (3a ed. Conceito Editorial)
“Teoria dos Valores Jurídicos" (esg. Mandamentos)
"A Essência do Direito" (2a ed. Rideel)
"O Imaginário em As Crônicas de Nárnia" (esg. Mundo Cristão)
"Lições das Crônicas de Nárnia" (Abba Press)
"Teologia e Imaginário" (Reflexão)
"Teologia do Fogo" (Moriá Editora)
“Manifesto contra o Mundanismo” (Moriá Editora)
“Estado de Direito e Imaginário Social” (No prelo pela Editora Fórum)

LIVROS DOS QUAIS O PROFESSOR GLAUCO BARREIRA MAGALHÃES FILHO É CO-AUTOR:
"Filosofia e Constituição" (Letra Legal)
"Constituição, Democracia, Poder Judiciário e Desenvolvimento" (Conceito Editorial)

"Dicionário de Teoria e Filosofia do Direito" (LTr) – Verbete “Jurisprudência dos Valores”
PREFÁCIOS FEITOS PELO PROFESSOR GLAUCO BARREIRA MAGALHÃES FILHO
Prefácio à tradução para o português de "Nas Chamas por Cristo" de Dave e Neta Jackson
Prefácio ao livro "Estado Moderno: Reforma Protestante e Contra-Reforma" de Oscar d´Alva e Souza Filho
Prefácio ao livro "A Dinâmica do Reino de Deus na Terra" de Francisco Muniz Tabosa

O DIREITO NATURAL E O PROTESTANTISMO

Foto do Prof. Glauco Filho em frente a igreja onde Martinho Lutero fixou as 95 teses (Wittenberg)


Há uma idéia equivocada segundo a qual os protestantes negam a existência do Direito Natural por assumirem uma posição fideísta que supõe não se poder conhecer os valores morais e ético-jurídicos senão através do texto bíblico. A realidade, porém, é bem outra, pois a Reforma reconheceu na natureza e na Bíblia os dois livros de Deus. Isso significa que Deus se revela tanto pela criação como pela revelação especial. O que os evangélicos insistem em afirmar é que a salvação por meio de Cristo só pode ser conhecida pela revelação especial (Escritura Sagrada).
            João Calvino falou da natureza como o “Teatro da Glória de Deus”, enquanto Abraham Kuyper viu nela instilada a “graça comum”.
            Lutero e Calvino, por priorizarem a teologia em relação à filosofia, não desenvolveram uma doutrina mais elaborada do Direito Natural, mas mencionaram episodicamente a lei natural (pressupondo a compreensão que dela tivera a cristandade em seu período patrístico e medieval).
            Max Weber, em seus escritos, deixou clara a existência de uma forte doutrina do Direito Natural entre os puritanos ingleses e seus sucessores norte-americanos.
            O maior teórico político do calvinismo do século XVII foi Johannes Althusius.A sua influência em Endem (Frísia Holandesa), uma das primeiras cidades a aderir à Reforma, foi comparada a de Calvino em Genebra. Althusius desenvolveu a idéia de Estado de Direito e manifestou-se um convicto jusnaturalista. Seguem as suas palavras:

            “A lei comum (lex communis), por sua própria natureza, é inspirada por Deus em todos os homens... Ela é comumente conhecida como lei moral (lei moralis) [..] Pelo conhecimento impresso por Deus dentro de nós, que é chamado de consciência, o homem conhece e entende a lei (jus) e os meios a empregar ou evitar para manter a obediência a essa lei. [...] A lei peculiar (lex própria) é aquela formulada e estabelecida pelo magistrado com base na lei comum (lex communis)... Portanto, essa lei peculiar (jus proprium) nada mais é do que a prática da lei natural (jus naturale), adaptada a uma política particular”.

            Portanto, Althusius chama o Direito Natural de “Lei Comum” e o Direito Positivo de “Lei Peculiar”.
            Pablo Lucas Verdú, falando sobre a “Escola Jusnaturalista Protestante”, disse:

            “Também merece citar-se Johannes Althusius (1557-1638), porque ele se antecipou na defesa da idéia de Estado de Direito, como comprova seu propósito de eliminar a expressão ‘potestas legibus soluta’ da definição de ‘majestas’. Seu influxo foi notável em autores posteriores”.

            Em período mais recente, Herman Dooyerweerd, conhecido jusfilósofo protestante da Holanda (considerado pelo jusnaturalista Giorgio Del Vecchio como o “filósofo mais profundo, inovador e penetrante desde Kant”), defendeu uma lei ínsita a criação de Deus na qual baseou a sua “Filosofia da Idéia Cosmonômica”.
            Quando se pensa que o protestantismo é contrário ao Direito Natural geralmente se confunde o protestantismo com o barthianismo. Karl Barth foi um famoso teólogo protestante do século XX que negou a existência do Direito Natural. A perseguição sofrida no regime nazista, porém, abrandou um pouco a sua oposição ao Direito Natural. Daniel Cornu relata que Barth mostrou a correspondência analógica de muitas premissas do jusnaturalismo com verdades bíblicas como forma de sustentar que poderíamos defendê-las por inferências e comparações na Bíblia, sem apelar para a estrutura da criação. Na verdade, parece-nos que Barth acreditava no Direito Natural, mas não estava disposto a apresentá-lo em categorias filosóficas, pois priorizava a perspectiva e a linguagem teológica.

Prof. Glauco Barreira Magalhães Filho (Livre Docente em Filosofia do Direito)
Autor do verbete “Jurisprudência dos Valores” no Dicionário de Teoria e Filosofia do Direito da LTr


                       

sábado, 4 de fevereiro de 2012

PREFÁCIO DO DR. RUSSELL SHEDD AO LIVRO “LIÇÕES DAS CRÔNICAS DE NÁRNIA” DO PROFESSOR GLAUCO BARREIRA MAGALHÃES FILHO




Foto do Prof. Glauco Barreira Magalhães Filho e Família em frente a casa onde morou C. S. Lewis (Oxford)



Desde os anos 50, tenho tido grande prazer em ler os livros de C.S. Lewis.  Trouxe para a língua portuguesa, por intermédio da Edições Vida Nova, os livros populares:  The Screwtape Letters ( “Cartas do Inferno”), Mere Christianity (“Razão do Cristianismo”)  e (Transposition and Other Essays, “O Peso da Glória”).  Lewis me fascina por duas razões:  Sua habilidade de raciocinar persuasivamente, e mais ainda, sua capacidade de usar palavras para estimular a imaginação.  Agora, por meio deste livro escrito pelo pastor e professor Glauco, o leitor terá acesso a outras qualidades extraordinárias deste professor cristão de literatura da Cambridge University na Inglaterra, sendo  principal entre elas o seu profundo domínio da filosofia e teologia, mesmo sendo leigo.   Considero um privilégio penetrar o pensamento de Lewis, conduzido  por um guia que comprova uma compreensão profunda e esclarecedora das conhecidas Crônicas de Nárnia.
Não esperava ler um livro que viesse iluminar tão nitidamente as fascinantes verdades teológicas escondidas nas páginas das Crônicas de Nárnia. Entre elas, a observação de que o Deus infinito não pode ser fruto da imaginação, pois, não corresponde a nada percebido pelos nossos sentidos. Temos aqui também uma explicação porque existe a pressão para divinizar Maria na Igreja Católica.
            O Prof. Glauco percebe o conceito do mal como o não ser, de modo que  na mitologia da feiticeira branca, ela pode tirar a vida ou transformar um ser vivo numa estátua.  Aslam, que representa Deus, por outro lado exerce poder criativo.  Os personagens que tem  contato amoroso com Ele são gradativamente transformados em seres melhores, mais bondosos.  Esta visão da realidade apresentada por Lewis, uma vez desvendada pelo autor nesta obra, é muito sugestiva.
As lições que o Prof. Glauco extrai das Crônicas e de O Senhor dos Anéis de Tolkien, que era um amigo chegado de Lewis, são extremamente valiosas.  Além de explicar o simbolismo por trás  da ficção, há penetrantes discussões acerca do mal, de Satanás, da consciência humana, e da igualdade dos dois sexos, sem serem criados para exercer as mesmas funções.
Acredito que em cada página o leitor encontrará vislumbres de realidades espirituais e morais.  É uma obra altamente recomendável que não deixará  de fazer bem para todos que puderem ver as verdades aqui escondidas.
A Deus toda a glória!

Russell P. Shedd
Ph.D (Universidade de Edimburgo - Escócia)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Notícias do Reino Unido

O ex-Arcebispo Anglicano da Cantuária, George Carey (hoje, Lord Carey), defendeu o direito de homossexuais superarem as atrações por pessoas do mesmo sexo através da orientação de psicoterapeutas, bem como o direito de conduzir a terapia por parte de profissionais competentes de formação judaico-crsitã. O documento produzido por Carey foi encaminhado para a associação Britânica de Aconselhamento e Psicoterapia e para o Conselho Britânico de Psicologia, havendo sido assinado por vários bispos em exercício e por bispos eméritos (aposentados).
John Sentamu, Arcebispo anglicano de York, disse recentemente contra o casamento de homossexuais:
“O casamento é uma relação entre um homem e uma mulher. Não me parece que o papel do Estado seja o de definir o que é o casamento. Vimos ditadores a fazê-lo em contextos diferentes”.

CIÊNCIA, FILOSOFIA, TEOLOGIA E O DIREITO NATURAL

Prof. Glauco e família com Fabiano Santiago e esposa na casa (museu) do teólogo e martir Dietrich Bonhoeffer (Berlim, Alemanha)



A capacidade e a vocação do homem para filosofar, isto é, para colocar repetidamente as perguntas fundamentais, revela que o seu pensamento não pode se limitar a uma projeção cultural do que é historicamente condicionado. A simples colocação dos problemas fundamentais em todas as épocas liberta o espírito humano de todas as limitações históricas.
            O historicismo é a perspectiva epistêmica que entende as filosofias (no plural) como reflexos do espírito humano em diferentes épocas e variadas culturas. Essa postura, todavia, possui um vício insanável, consistente em não aplicar os próprios pressupostos a si mesma, excluindo-se de seu próprio veredicto. O historicista, bem como todo relativista, classifica a todos como ingênuos, bem como julga estar falando da realidade a partir de uma perspectiva que o livra de todos os condicionamentos. Tal comportamento revela orgulho (um obstáculo moral ao verdadeiro conhecimento) e contradição. A contradição, porém, é do historicismo e do relativismo, não da realidade.
            As “diferentes” concepções de justiça presentes em várias nações e épocas não foram conhecidas apenas há pouco tempo. Na verdade, o conhecimento dessas aparentes divergências nunca desqualificou a tese de um Direito Natural ínsito a humanidade, mas sempre foi considerado como a condição para a procura e descoberta dessa idéia. A variedade de opiniões foi e é um incentivo para procurar o Direito Natural.
            O fracasso do “Direito Natural” da codificação do Direito Civil francês decorreu do fato de ele estar em oposição não apenas ao arbitrário, mas também ao supramundano. A ausência de Deus levou a divinização da razão, o que teve por conseqüência uma crença ingênua em suas pretendidas possibilidades ilimitadas. O fracasso do ideário jusnaturalista francês é o fracasso da razão autônoma e da incredulidade, não do Direito Natural.
            Se os nossos valores se limitassem a um pensamento condenado a morrer na próxima geração, e nós soubéssemos disso, não encontraríamos energias positivas para lutar pela sua realização. Os que aparentassem ter tais energias seriam apenas demagogos ou cínicos.
            Karl Jaspers, um filósofo existencialista, disse em sua “Iniciação Filosófica”:

            “... Mas, apesar de condicionados pela época, não é a partir desse condicionamento que filosofamos; é, como sempre, a partir do englobante. Não devemos atribuir a nossa época a responsabilidade do que somos nem submetermo-nos a ela; devemos tentar esclarecê-la, aprofundando-a até onde nos seja possível”.
            Não devemos também fazer da história uma divindade. Não é necessário aceitar o ímpio adágio segundo o qual a história mundial é o juízo final. Não é a suprema instância. O malogro não é um argumento contra a verdade que radica na transcendência. Assimilando a história, mas atravessando-a, fundeamos na eternidade”.

            A causa da dominância do historicismo nas ciências humanas e do naturalismo nas ciências naturais é que os pretensos argumentos para prová-los já presumem a sua validade, o que gera um argumento informalmente válido conhecido como petição de princípio ou argumento circular. Para Aristóteles, a petição de princípio era uma falácia lógica (sofisma), enquanto, para Perelman, era uma falácia retórica.
            Max Weber, apesar de seu cientificismo, reconheceu que a filosofia e a ciência se baseiam, em última análise, não em premissas evidentes ou constatáveis, mas na fé de que a verdade é acessível ao homem. Assim, a ciência e a filosofia não podem justificar o seu próprio fundamento de uma maneira inequívoca.
            Weber acreditava que toda a devoção a causas ou a ideais possuía raízes na fé religiosa. Sem fé, morreriam os ideais. Desse modo, o futuro do mundo oscilaria entre o desespero do vazio espiritual total e o ressurgimento da religião.
             Na estrutura da constituição humana, encontramos o prazer pela investigação do enigma do ser. No entanto, nós alimentamos mais ansiedade e inquietação do que paz. Isso acontece porque desejamos intensamente a solução da referida investigação, mas esbarramos nas limitações da razão humana. Em meio a essas angústias, aparecem fortes razões exteriores e interiores para acreditar em um criador. Isso nos faz pensar que Deus não alimentaria em nós uma sede que não pudesse saciar. Tal conjectura nos mostra a razoabilidade da revelação divina contida nas Escrituras Sagradas. A razão deve reconhecer os seus limites (sendo esse seu maior mérito) e apelar para a sua fonte última (Deus). É dentro desse escopo que devemos pensar a relação entre filosofia e teologia. 


                        Dr. Glauco Barreira Magalhães Filho
Professor da Escola Superior da Magistratura do Estado do Ceará (ESMEC)
Professor da Escola Superior do Ministério Público (ESMP)