CRISTIANISMO E UNIVERSIDADE

Seja bem-vindo a "CRISTIANISMO E UNIVERSIDADE". Aqui procuraremos apresentar artigos acerca de assuntos acadêmicos relacionados aos mais diversos saberes, mantendo sempre a premissa de que a teologia é a rainha das ciências, pois trata dos fundamentos (pressupostos) de todo pensamento, bem como de seu encerramento ou coroamento final. Inspiramo-nos em John Wesley, leitor voraz de poesia e filosofia clássica, conhecedor e professor de várias línguas, escritor de livros de medicina, teólogo, filantropo, professor de Oxford e pregador fervoroso do avivamento espiritual que incendiou a Inglaterra no século XVIII.

A situação atual é avaliada dentro de seus vários aspectos modais (econômico, jurídico, político, linguístico, etc.), mas com a certeza de que esses momentos da realidade precisam encontrar um fator último e absoluto que lhes dê coerência. Esse fator último define a cosmovisão adotada. Caso não reconheçamos Deus nela, incorreremos no erro de absolutizar algum aspecto modal, que é relativo por definição.

A nossa cosmovisão não é baseada na dicotomia "forma e matéria" (pensamento greco-clássico), nem na dicotomia "natureza-graça" (catolicismo), nem na "natureza-liberdade" (humanismo), mas, sim, na tricotomia "criação-queda-redenção" (pensamento evangélico).

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terça-feira, 8 de janeiro de 2013

ESCATOLOGIA NA HISTÓRIA DA IGREJA

Dr. Glauco Filho e Família




À luz da história da igreja, nós percebemos que os movimentos cristãos marcados pelo fervor ou pelo êxtase sempre tiveram uma ênfase escatológica. Assim, o Novo Testamento nos indica uma grande expectativa quanto à vinda iminente de Cristo na igreja primitiva. Por meio da promessa do segundo advento de Jesus e da mudança no presente estado de coisas, os cristãos tinham uma poderosa consolação em meio às perseguições patrocinadas pelos judeus e pelo Império Romano. Irineu, um ilustre “Pai da Igreja” sustentou a associação entre a vinda de Cristo e a implantação de um reinado milenar terreno. Uma posição semelhante foi defendida pelos montanistas, que enfatizaram os dons extáticos, entendendo a restauração do carisma entre eles como um sinal da proximidade da vinda de Cristo e do milênio.
         A partir de Constantino, o Império Romano passou a ser um aliado da igreja. Surgia a Cristandade, que, passando a ter vida própria, sobreviveu e se ampliou após a queda do Império. A ênfase na vinda iminente de Cristo passou a ser cada vez menos enfatizada. A esperança de expansão e domínio do cristianismo passou a trazer uma “consolação” mais imediatista. A igreja rejeitara o milênio escatológico, assumindo posturas amilenistas.
         Na Idade Média, Joaquim de Fiore estabeleceu um dispensacionalismo histórico que colocava a era do Espírito Santo como o estopim dos eventos escatológicos. O seu pensamento era fruto do fervor místico existente na época. Ao mesmo tempo, muitos grupos “heréticos” da Idade Média sustentaram a esperança da segunda vinda de Cristo e do milênio, denunciando a Cristandade como obra do Anticristo e a igreja de Roma como a “Grande Babilônia”. A perseguição papal sofrida por esses genuínos crentes produziu neles os mesmos sentimentos presentes nos primeiros cristãos, os quais, por sua vez, também foram perseguidos pelo Império Romano.
         Durante a Reforma na Alemanha, houve uma forte perspectiva escatológica nos escritos iniciais de Lutero. A aceitação da estatização eclesiástica, porém, causou um abandono dessa perspectiva, a qual foi retomada em parte pelo pietismo luterano.
         Entre os calvinistas, defendia-se uma fase de expansão do verdadeiro cristianismo depois da fase decadente da Idade Média. Essa visão pós-milenista colocava a vinda de Jesus depois dessa restauração da igreja.
         Entre os anabatistas e batistas, perseguidos e sem aproximação institucional com os Estados, houve maior expectativa do retorno iminente de Jesus, bem como fortes esperanças milenistas. Também houve muitos movimentos “entusiastas” (extáticos) entre esses grupos.
Os avivamentos que ocorreram nos EUA antes da guerra civil americana foram caracterizados por uma visão escatológica otimista e pós-milenista. Acreditava-se que o avivamento traria uma era de transformação e glória espiritual que antecederia ao retorno de Cristo. Em geral, predominava a soteriologia calvinista.
Após a guerra civil americana, o pré-milenismo foi ganhando força nos reavivamentos, principalmente com versão que lhe foi dada por J. N. Darby. A soteriologia arminiana do metodismo também foi se impondo progressivamente.
O pentecostalismo nasceu da confluência da concepção de batismo dos batistas, do arminianismo metodista, da doutrina da segunda benção dos movimentos de santidade e da escatologia pré-milenista. Obviamente, o pentecostalismo não se limitou a agregar esses elementos, mas também lhes fez adaptações. Desse modo, a segunda benção deixou de ser uma experiência imediata de santificação para ser um revestimento de poder para serviço (depois de superado um momento incipiente do pentecostalismo em que o revestimento era visto como uma “terceira benção”).
No campo escatológico, o pentecostalismo também fez adaptações ao pré-milenismo. Os pré-milenistas, em geral, tinham uma visão pessimista não apenas do mundo, mas também da igreja. Acreditavam que o mundo estava se degenerando moralmente e a igreja estava se perdendo na apostasia, restando apenas um remanescente fiel que não alimentava esperanças de um avivamento, mas unicamente do arrebatamento da igreja. O pentecostalismo também anunciava que o mundo estava piorando, mas, em relação à igreja, sustentava uma polarização. Ao mesmo tempo em que acontecia a apostasia de um lado, surgia um grande avivamento (“chuva serôdia”) do outro.
Os primeiros pentecostais sofreram também muita perseguição, tanto por parte do “mundo” como por parte das “igrejas históricas”. Embora tenham se aproximado doutrinariamente do fundamentalismo evangélico, foram rejeitados pelos fundamentalistas assim como foram rejeitados pelos liberais. Além disso, os pioneiros pentecostais não simpatizavam com a aproximação da igreja com a política. Dentro desse contexto de rejeição e exclusão, os pentecostais tinham razões para se apegar ao pré-milienismo. Jesus arrebataria a sua igreja antes que viesse a Grande Tribulação e, depois, voltaria em glória em companhia dos seus para estabelecer o milênio.
O pentecostalismo original, nos aspectos acimas mencionados, guarda uma notável afinidade com os antigos batistas (anabatistas), exceto no fato de os batistas crerem na perseverança final dos santos, uma doutrina bíblica importantíssima.
O pentecostalismo clássico seguiu a linha histórica dos movimentos extáticos do passado, os quais ligavam a obra carismática do Espírito às expectativas escatológicas. Além disso, os desmandos da natureza (catástrofes), as guerras, a depravação moral, os eventos em Israel foram apontados como sinais indicadores da iminência dos eventos escatológicos.
Para o pentecostalismo tradicional, a expectativa escatológica serviu de fundamento para a urgência missionária, enquanto o poder do Espírito alimentava a crença no êxito dos empreendimentos.
A convicção de que esse mundo estava se degenerando moralmente e caminhando para o juízo levou os pioneiros pentecostais a buscar diferença dele. A moral puritana dos pentecostais clássicos mais antigos era marcada pelo pudor e pela simplicidade. O modo simples de viver e de se vestir rompia com a lógica da sociedade do consumo e evidenciava a ausência de preocupação com os critérios de sucesso definidos pela sociedade secular.
O neopentecostalismo pós-moderno, entretanto, assumiu outra perspectiva. Abrandou a ênfase mística no batismo no Espírito Santo e nos dons de inspiração, voltando-se para uma obsessão por cura divina e por prosperidade financeira. A cura, por outro lado, não tem sido enfatizada tanto como sinal de confirmação do evangelho ou da presença de Deus, mas como autenticação pessoal dos novos “pregadores” pentecostais, o que tem gerado uma forte promoção pessoal. Diferentemente do antigo pentecostalismo, a saúde não tem sido desejada como um meio para obtenção de vigor para pregar o evangelho, mas, sim, como um caminho para desfrutar de uma vida prazerosa e regalada no presente mundo.
O neopentecostaismo acredita que a prosperidade terrena (acúmulo de bens e sucesso) é sinal da benção de Deus. Desse modo, o fiel procura mostrar aos outros a sua boa condição diante de Deus através do consumo de bens supérfluos. O neopentecostaismo é uma acomodação da religião à sociedade de consumo. Esse mundo passa a ter os seus critérios de sucesso aceitos pela igreja. Embora ocasionalmente os neopentecostais possam falar contra algum pecado moral, a pregação gira em torno de uma revanche “contra o diabo” na vida física, familiar e profissional. São condenados com maior veemência aqueles pecados que destroem o patrimônio (alcoolismo, drogas, divórcio, etc).
O crescente predomínio do neopentecostalismo ameaça a escatologia do pentecostalismo clássico. Esse último mantinha uma vigilância contra o mundo, uma pregação moral e profética, uma expectativa da vinda de Cristo e a esperança de uma nova ordem de coisas pelo milênio. O neopentecostaismo promove a busca de felicidade e satisfação em bens e condições existentes no presente século. A esperança imediata de aquisição de novos bens ou de cura para uma nova doença sufoca qualquer expectativa transcendente de uma nova ordem de coisas.
O neopentecostalismo, ao reformular a esperança pentecostal, inverte a ordem de valores, muda o código de conduta e trai a espiritualidade (manifesta nos hinos e nos motivos missionários) do pentecostalismo clássico.
Dr. Glauco Barreira Magalhães Filho
Doutor em Teologia
Doutor em Ministério
Pós-Graduado em Teologia Histórica e Dogmática

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